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Compartilhando o que é bom: dicas incríveis sobre o trabalho com os nomes próprios em alfabetização a partir da obra de Maria de Fátima Russo

Atividades em alfabetização: Teoria e prática na utilização do nome próprio
Maria de Fátima russo

O nome próprio como modelo estável

Quando o sujeito se propõe a aprender a ler e a escrever, já está sensibilizado em relação a um modo de comunicação decorrente de elaborações sociais até então alheias e estranhas à sua pessoa, modo este que requer sua compreensão para se tornar um instrumento eficiente na sua relação com o outro, consigo mesmo e com o mundo.
Neste momento, o alfabetizando não recebe passivamente as informações que a linguagem lhe oferece, ele se mobiliza para compreendê-las. No entanto, nem toda informação que a linguagem oferece ao alfabetizando é refletida e transformada em aprendizagem sobre a leitura e a escrita porque, nem sempre, são atribuídos a ela, à informação, significados compatíveis com o conhecimento já instaurado no sujeito, nem sempre, o que se mostra faz sentido e, nem sempre, os dados apresentados se prestam às elaborações mentais qualitativamente mais abrangentes.
Uma vez iniciada, a aprendizagem da Língua nunca termina. A cada novo dado passível de conflito, reelaborações são feitas, elaborações inéditas vão se apresentando e novas aprendizagens vão acontecendo. Entenda-se aqui aprendizagem como o resultado da elaboração mental que pode ou não estar de acordo com os padrões da Língua, mas é uma conquista construída internamente e diferenciada de um saber anterior. Em ambos os casos, ela é generalizável também mentalmente, de modo definitivo ou não.
Para que o alfabetizando desenvolva o processo de construção do sistema de escrita, precisa de informações que realmente resultem em aprendizagens significativas passíveis de serem generalizadas e que estas o aproximem da construção do código com base alfabética que estrutura a Língua.
O modelo é percebido e captado peço pensamento do alfabetizando e orienta um modo de reflexão, sugerindo relações, confirmando ou não hipóteses, solucionando dúvidas, alertando o alfabetizando sobre suas conclusões e incentivando a reformulação de saberes. Aos poucos, o modelo vai desestruturando sua condição de sabedor, lembrando-lhe que ainda falta algo a conhecer ou confirmando um conhecimento anteriormente construído.
A princípio, o modelo é reproduzido por imitação porque o alfabetizando não tem ainda como prever ou explicar suas propriedades. E isto acontece até que, gradativamente, os elementos que constituem esse modelo e sua forma de organização sejam compreendidos, configurando um exemplo importante que ilustra uma ideia e que confirma uma regra.
Para o alfabetizando, a estabilidade do modelo é ponto de referência na confrontação entre suas hipóteses e a realidade convencional da escrita e favorece as aprendizagens, uma vez que as reelaborações são feitas sobre o mesmo elemento e modo de se mostrar, o que parece otimizar o tempo e os caminhos entre as relações estabelecidas no pensamento.
O modelo precisa fazer sentido para ser considerado como tal. Precisa trazer mensagem significativa ao universo particular do alfabetizando, e não será qualquer palavra, qualquer texto que desempenhará este papel. O que se propõe ser m modelo precisa vir carregado de sentimento e sensibilizar o alfabetizando. Enfim, precisa falar ao sujeito em questão e, ao fazer sentido, passará a fazer parte de suas elaborações mentais.
No universo linguístico, determinados signos, palavras e textos provocam nas pessoas percepções diferenciadas, fazendo-as movimentarem-se no sentido de atribuir-lhes significados particularmente especiais. Tais signos remetem estas pessoas a si mesmas, a outras pessoas, a fatos e a sentimentos de tal modo que despertam emoções igualmente diferenciadas e que mobilizam o Ser, fazendo mais sentido.
Neste universo de significação, nada é mais significativo e nada é mais carregado de sentimento do que o nome próprio do sujeito. O nome próprio é o signo que define o ser. Define um contexto vivido e sentido. O nome fala do sujeito e é o próprio sujeito. Pertence-lhe e o representa.


A relação de pertinência e de representatividade que o nome desempenha no âmbito psíquico da criança, o nome é referência muito importante para a criança porque, além de pertencer-lhe e representa-la em um contexto histórico-social-afetivo, tem valor de verdade. (RUSSO, 2000, p. 27)
Seja pelo aspecto familiar, seja pelo histórico-social-afetivo, pelo psíquico, ou por tantos outros, o fato é que o nome como signo linguístico encerra o significante e o significado na própria origem do sujeito, na sua própria existência. O nome próprio é o sujeito, o representante, o contexto e a mensagem. E isto torna seu nome um elemento confiável nas suas elaborações mentais.
O estado de imutabilidade que o nome encerra provoca no alfabetizando a percepção das características gráficas que não se alteram e, a partir da reflexão sobre o modo de ser do seu nome e da comparação entre ele e outras palavras, o alfabetizando é impelido a levantar hipóteses com os aspectos figurativos dele percebidos.
Gradativamente, o nome próprio vai informando ao alfabetizando sobre a quantidade, a variedade e a organização das letras que fazem parte na formação desta palavra específica e vai auxiliando a formulação de hipóteses e a confrontação de ideias entre seu nome e a realidade convencional da escrita de outras palavras.
O nome próprio é um signo simbólico facilitador na aprendizagem da leitura e da escrita de outras palavras, e o alfabetizando demonstra ter conhecimento da importância do seu nome e do papel que este signo irá desempenhar porque, quando está se alfabetizando, espontaneamente faz dele modelo.
O nome próprio vai se tornando um modelo estável na medida em que o alfabetizando, tendo se apercebido da sua forma fixa e das características figurativas da palavra como imutáveis, resgata-o na memória e faz dele um elemento constante de comparação e de levantamento de hipóteses.
A comparação do próprio nome, enquanto modelo, com outras palavras mostra-se inevitável devido à representatividade, ao sentido de posse, à presença constante, ao valor de verdade, à significação e à estabilidade que seu nome proporciona ao alfabetizando, uma vez que estes sentidos são extremamente importantes para o ser cognoscente que precisa e procura informações confiáveis para assimilá-las e transformá-las em conhecimento.
O modelo nome próprio fornece informações ao alfabetizando que, dele, extrai características. Contudo, as informações não são percebidas de imediato, e as características não são extraídas todas ao mesmo tempo, porque, para perceber cada uma delas, o alfabetizando precisa de condições internas que permitam tal percepção, possíveis elaborações e futura apropriação.
O alfabetizando discrimina oral e graficamente seu nome em meio a outras palavras e vai refletindo sobre seu modo de formação com muita propriedade. Compara-o com outras palavras, estabelece semelhanças e diferenças e, ao supor possibilidades de relações com outras palavras, elabora hipóteses e verifica que algumas características se confirmam e outras não.
Ao confirmar as hipóteses em seu nome e em palavras diferentes do seu nome, o alfabetizando estabelece este conhecimento como certo. Caso contrário, continua seu trabalho de investigação, aplicando o conhecimento que já tem decorrente de situações similares, adequando-o à especificidade da situação, em busca de um novo conhecimento que se estruture como correto e que possa ser generalizável.
A cada nova informação percebida, a cada nova elaboração, ressignificação e apropriação, o nome vai se modificando no nível de compreensão do alfabetizando. É como se, no pensamento, o nome não se apresentasse do mesmo modo que o anterior. É como se o alfabetizando já não visse seu nome com os mesmos olhos, pois estes vão se alertando para detalhes que antes não eram considerados por ele, e o nome passa a explicar, ou não, as conclusões resultantes das hipóteses levantadas. Consequentemente, o alfabetizando, que se desorganizou internamente para poder reorganizar-se perante as novas informações, apresenta-se modificado, com novos conhecimentos. Deste modo, acontece uma interação em que o sujeito cognoscente e o objeto de conhecimento já não são os mesmos. Ambos se modificaram, um na perspectiva do outro. Assim, alfabetizando  e nome já não são como eram antes, pois cada um já sofreu a ação do outro, já foi transformado.
O aluno se alfabetiza. Percebe o que elege significativamente como interessante, recebe o que estruturalmente é possível receber do meio e da intermediação do professor, e só aproveita do que recebeu como informação do estímulo externo os elementos compatíveis com as estruturas internas de seu organismo, o que sua capacidade de operacionalizar permite transformar em possíveis aprendizagens. Isto explica por que, algumas vezes, ao se tentar ensinar saberes ao alfabetizando, este não aprende, simplesmente porque não consegue mobilizar seus esforços naquela direção, naquele momento, ou melhor, porque ainda não está em si refletir aquele saber para torna-lo seu.
Na intervenção pedagógica, a relevância do trabalho com o nome próprio do alfabetizando se confirma quando se estabelece a relação entre desejo e conhecimento, ao favorecer a combinação entre a opção espontânea do alfabetizando em fazer uso do seu próprio nome nas suas elaborações e a referência que a estabilidade linguística do nome configura como um modelo significativo. É um resgate do prazer no âmbito psíquico e no cognitivo, amparados pelo afetivo.

Situações a serem exploradas:

Em relação ao próprio nome, mais especificamente ao prenome, o alfabetizando, nas atividades, deve ser incentivado a estabelecer relações que o façam perceber e refletir, por exemplo, sobre:
·         A quantidade de letras do seu nome;
·         As letras que estão na formação de seu nome;
·         As letras que não estão na formação de seu nome;
·         A letra inicial do seu nome;
·         A letra final de seu nome;
·         As letras que se repetem em seu nome;
·         As vogais de seu nome;
·         As consoantes de seu nome;
·         As consoantes que não estão em seu nome;
·         Posição de casa letra em seu nome (primeira letra, segunda letra, etc);
·         A emissão sonora do seu nome;
·         A relação entre a oralidade e a grafia do seu nome;
·         A quantidade de sílabas do seu nome; e
·         As sílabas do seu nome.

Na comparação do seu nome com os nomes dos colegas da classe, o alfabetizando, nas atividades, deve ser incentivado a estabelecer relações que o façam perceber e refletir, por exemplo, sobre:
·         Nomes iguais aos seus;
·         Nomes diferentes do seu;
·         Nomes parecidos com o seu;
·         Nomes que começam com a mesma letra que o seu;
·         Nomes que terminam com a mesma letra que o seu;
·         Nomes que têm a mesma quantidade de letras que o seu;
·         Nomes maiores que o seu;
·         Nomes menores que o seu; e
·         Nomes que têm sílabas iguais às do seu.
Em relação a todos os nomes dos alunos da classe, o alfabetizando, nas atividades, deve ser incentivado a estabelecer relações que o façam perceber e refletir, por exemplo, sobre:
·         Letras que são mais utilizadas;
·         Letras que são menos utilizadas;
·         Letras que não estão nos nomes;
·         Letras que não são utilizadas como iniciais;
·         Letras que não são utilizadas como finais;
·         Nomes que começam com letras finais de outros nomes;
·         Quantidade de letras de cada nome;
·         Letra K, W e Y nos nomes;
·         Relação entre oralidade e grafia dos nomes;
·         Letras que podem ser substituídas por outras (CAMILA – KAMILA);
·         Letras que poderiam ser retiradas, e o resultado sonoro sem mantém (JACQUELINE – JAQUELINE);
·         Sílabas que aparecem mais nos nomes;
Ao desenvolver o trabalho com nomes, o professor-alfabetizador tem que ter em mente que, dependendo da sua adequação, uma atividade pode ou não fazer diferença no processo de construção de conhecimento que o aluno está desenvolvendo. Assim, antes de propô-la e para torna-la efetivamente adequada, precisa levar em consideração que:
·         Não é qualquer atividade que contribui para a aprendizagem;
·         Não é a quantidade de atividades que define a qualidade da intervenção;
·         Não são somente as atividades escritas que contribuem com a alfabetização;
·         As atividades devem priorizar o raciocínio lógico;
·         As atividades devem contemplar práticas de leitura, de escrita e de comunicação oral;
·         São necessários a comanda e o questionamento adequados sobre a realização da atividade;
·         Às vezes, uma atividade não tem o entendimento imediato por parte do alfabetizando;
·         Nem sempre, o alfabetizando reage à atividade de acordo com a expectativa do professor;
·         Cada alfabetizando reage de acordo com suas possibilidades a uma mesma atividade;
·         Uma atividade que demande muito tempo de execução pode se tornar cansativa e não surtir o efeito esperado;
·         A interação entre os alunos durante uma atividade pode ser a contribuição que um deles precisa para avançar em suas hipóteses;
·         A interação entre alunos é positiva na medida em que todos progridam de alguma maneira em termos de conhecimento;



Lembrem-se: é imprescindível saber o que o alfabetizando conhece sobre a Língua: em que hipótese está, se já conhece as letras do alfabeto. Fazer uma boa sondagem de escrita é fundamental.

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